Eu Tinha Certeza Que Era De Outro Planeta!
Existe um silêncio específico, único, que só quem já se sentiu deslocado entende. Não é o silêncio externo, mas aquele que você percebe quando está cercado de gente e, mesmo assim, se sente separado por um vidro invisível. Quem nunca pensou: o que eu estou fazendo aqui? Será que sou feito de uma matéria diferente das outras pessoas?
É curioso como desde cedo as diferenças ficam sussurrando no ouvido. São pequenas coisas: o jeito de pensar, sentir, perceber. O mundo parece funcionar para todos – menos para você. E, sem querer, você vai carregando dúvidas, receios, vergonha até. Às vezes, parece que todo mundo recebeu um manual secreto, exceto você.
Hoje quero contar um pouco dessa sensação de ser “de outro planeta”, do peso e, estranhamente, do brilho disso tudo. Talvez você se reconheça em fragmentos dessa história. Talvez perceba que não está tão só como pensa.
Primeiros sinais: quando tudo já parecia estranho
Minha memória de me sentir diferente começa antes mesmo de entender o que era ser diferente. Eu crescia dentro de uma casa comum, família comum, vizinhos comuns. Mas havia algo… torto. Era como se o encaixe das coisas não acontecesse.
Na escola, os outros pareciam achar graça de coisas muito simples. Eu tentava rir junto, imitava, mas dentro de mim, sentia algo se perdendo. Não era só timidez. Era como se a sintonia estivesse fora do ar.
- Quando todos queriam brincar de um jeito, eu preferia outros mundos inventados por mim.
- As falas óbvias para eles pareciam complicadas, confusas e, às vezes, sem sentido para mim.
- Barulhos, luzes, toques… tudo parecia demais, exagerado, cansativo.
Eu pensava: será que só eu percebo o mundo tão intenso? Perguntei aos adultos – ouvi risadinhas, broncas, evasivas. Logo aprendi: melhor guardar para mim.
A fase da infância pode ser um ponto sensível para quem convive com neurodivergências. Estudos recentes, como o estudo da Faculdade de Medicina da USP, mostram como experiências negativas e maus-tratos podem potencializar sintomas de TDAH e dificultar ainda mais o desenvolvimento de uma autoimagem saudável.
Sentir tudo, o tempo todo
Na adolescência, as comparações se intensificam. As diferenças que antes eram vistas como “fases” pelos adultos, agora viram motivo de brincadeira, exclusão, bullying. O olhar de julgamento pesa. E, para quem sente o tempo todo que há algo “fora do lugar”, cada crítica parece um carimbo duro demais.
Para mim, ir a festas era quase um exercício de sobrevivência. O barulho incomodava, as conversas pareciam sempre rápidas demais, eu travava na tentativa de me encaixar. Era como se as regras sociais fossem escritas em língua estrangeira.
Eu me perguntava se alguém ali sentia esse mesmo desconforto. Chegava até a buscar nos olhos dos colegas algum sinal de identificação, mas raramente encontrava. Só mais tarde fui perceber que muitos estavam, disfarçadamente, na mesma luta.
A verdade: nos sentimos sozinhos até descobrir que há outros “alienígenas” por aqui.
Nem sempre quem sorri por fora está em paz por dentro.
A rotina de não pertencer
Entrar na faculdade, conseguir o primeiro emprego… As fases mudam, mas a sensação persiste. É como se, a cada novo ambiente, eu precisasse reaprender as regras do planeta. Perguntei-me muitas vezes:
- Por que tudo parece tão difícil para mim?
- Será que existe algo errado no meu jeito de pensar?
- Por que falam que sou “lento” ou “avoado”?
O que machucava era que, mesmo me esforçando cinco vezes mais, era comum ouvir: “Ah, se esforça mais!”, “No fundo você é preguiçoso”, “Falta maturidade”. E, internamente, a crença negativa só aumentava. Por muito tempo, eu não tinha coragem de dizer em voz alta, mas pensava:
Talvez eu esteja quebrado. Ou meu planeta de origem seja mesmo outro.
Não ajudava saber que outros também ouviam críticas semelhantes. Percebi, pesquisando depois, que entre 5% a 8% da população tem sintomas de TDAH, mas poucas pessoas falavam disso abertamente. Era um silêncio coletivo, reforçando ainda mais a sensação de isolamento.
Autocobrança e invisibilidade
Com o tempo, não é só sentir que não pertence. Tem também uma cobrança pesada. “Por que você não se adapta?”, “Quando vai amadurecer?”, “Precisa ser mais focado”. O ciclo é cansativo: quanto mais você tenta, maior a expectativa, maior a decepção.
Isso gera consequências reais:
- Aumento da ansiedade em tentar prever todos os cenários para não errar de novo.
- Desgaste emocional pelo medo constante de desapontar outra vez.
- Tendência ao isolamento, para evitar olhares e julgamentos.
É desgastante. Às vezes, dói mais do que qualquer dor física.
O maior medo? Ouvir de novo que minha diferença é, na verdade, deficiência de caráter.
Troquei de fases, lugares, convívio. Levei na bagagem esse “peso extra” de não caber. Por muito tempo, nem imaginei que isso pudesse ser, de alguma maneira, um traço compartilhado por tanta gente.
Buscando respostas: o choque do diagnóstico
Chegou um momento em que, cansado de procurar justificativas, comecei a buscar respostas reais. Passei por consultas, avaliações, testes. A cada nova explicação, recebia um rótulo: ansioso, depressivo, hiperativo, “difícil”. Não havia acolhimento, só receita passada depressa, como se eu fosse só mais um nome numa lista.
A verdadeira virada surge quando finalmente, depois de anos, alguém olha para você, ouve suas histórias e diz: “Seu cérebro funciona diferente. E está tudo bem.”
Ali, um universo abriu.
Nem errado, nem quebrado: apenas diferente.
Receber um diagnóstico de neurodivergência é estranho. Não é automático sentir alívio. Primeiro vem o medo: o que muda agora? Será que vão me olhar com pena? Eu mesmo duvidei. Era mais fácil seguir achando que o problema era meu, só meu. Por outro lado, saber que existe uma explicação além do “você é esquisito”, acende uma faísca de compreensão.
Revisitando o passado: tudo ganha “novo sentido”
Na sequência, você começa a enxergar antigos episódios sob outra ótica. Lembra das reações “exageradas”, do tédio absurdo em tarefas repetitivas, da inquietação, das crises de ansiedade antes de eventos sociais. A ficha vai caindo.
- A dificuldade em focar não é preguiça, é parte de um cérebro que busca estímulos variados.
- Ser “emocional demais” pode ser sensibilidade ampliada, não falta de maturidade.
- Precisar de um tempo sozinho para recarregar é necessidade autêntica, não “frescura”.
No começo, é revoltante – afinal, por décadas ouvi que era culpa minha. Mas aos poucos, aceitando as origens dessas diferenças, nasce uma compaixão inédita. Não só por mim, mas por todos que passaram o mesmo.
Descobrir que existem nomes, estudos, relatos e ciência por trás do que sinto muda tudo.
As dores de ser de outro planeta
Ainda assim, carrego comigo marcas que nunca vão sumir. Sinto, de tempos em tempos, o velho desconforto voltando. O mundo segue acelerado, exigente, e as pessoas continuam esperando respostas típicas de pessoas “comuns”.
Mas há certas dores recorrentes:
- O medo de não ser aceito do jeito que realmente é.
- A culpa por fracassos que, depois, percebo que não estavam sob meu controle.
- A solidão de não ter ao lado quem compreenda as entrelinhas desse sentir diferente.
Essas marcas não impedem de seguir. Mas me ensinam a pisar com cautela, criar mecanismos próprios, buscar refúgios de paz.
Ser de outro planeta não é sinônimo de ser sozinho pra sempre.
Pequenos escapes: onde eu encontrava alívio
Antes mesmo de ter um nome para o que sentia, eu me escondia em livros, músicas, vídeos. Criava lugares seguros dentro da minha cabeça, onde podia ser quem quisesse, sem medo.
- Ler era respirar fora do tempo, mergulhar em outras realidades.
- A música silenciava o turbilhão interno, ordenava as emoções.
- Até mesmo inventar histórias virava um jeito de materializar o caos interno.
Não era fuga. Era sobrevivência.
Hoje vejo que, enquanto procurava sentido fora, estava, na verdade, aprendendo a cuidar de mim. Essas pequenas práticas de autocuidado mantinham a mente respirando, mesmo nos dias mais escuros.
Quando tudo começa a se transformar
Não foi do dia para a noite. Mas, com o tempo, comecei a descobrir pessoas “do meu planeta”. Outras que também sentiam demais, pensavam demais, duvidavam de tudo. Trocar experiências, ouvir relatos, ver histórias parecidas à minha foi restaurando um pouco da esperança.
Conversas sinceras, escuta sem julgamentos – isso fez uma diferença gigante. Percebi que a empatia não é só gentileza, ela é também ponte para sobrevivência.
Empatia é abrigo para quem anda perdido entre mundos.
Aos poucos, fui revisitando minha história e entendi que eu podia transformar minhas “estranhezas” em recursos. Parei de lutar tanto para ser igual aos outros e tratei de conhecer meu jeito – até gostar dele. Não aceito tudo o tempo inteiro, mas respeito mais as minhas próprias regras internas.
O lado bom de não se sentir daqui
Hoje, talvez com certo orgulho, vejo pontos positivos que nunca teria descoberto sem esse olhar – aparentemente – de outro planeta. Se, no início, era um fardo, agora é minha força em várias situações.
- Criatividade além do esperado, sempre imaginando caminhos alternativos.
- Sensibilidade para notar os detalhes que passam despercebidos pela maioria.
- Vontade constante de aprender mais, pensar diferente, fugir do comum.
- Capacidade de se identificar rapidamente com dores alheias.
- Senso de justiça afiado, não se conformando com padrões sem sentido.
Isso não apaga as dificuldades. Mas muda o foco. O que antes era disparador de vergonha, agora é combustível para contribuir de formas únicas nos ambientes que percorro.
Sigo lidando, diariamente, com a vontade de sumir, de fazer diferente, de “parar de sentir tanto”. Mas, honestamente, prefiro mil vezes ser intenso do que viver na superfície.
Hoje aceito: se vim de outro planeta, foi para enxergar o mundo com novas cores.
Conclusão: ninguém precisa estar sozinho no seu planeta
Muita gente se sente “errada”, “desajustada”, “fora do normal” em algum momento da vida. A verdade é que cada um carrega dentro de si um planeta particular, com clima, paisagens e regras próprias. Não é vergonha nenhuma perceber que não encaixamos nos moldes comuns.
Olhar para trás e entender os motivos desse sentir diferente é, muitas vezes, o primeiro passo. Ninguém precisa continuar acreditando que está só.
Acolher as próprias diferenças pode, sim, se transformar em potencial. Não há linhas retas na vida. Cada curva, cada vácuo, cada silêncio esconde força. E, no fim, todo planeta estranho encontra outra órbita para girar junto.
Perguntas frequentes
O que significa ser de outro planeta?
A expressão “ser de outro planeta” é uma forma simbólica de dizer que alguém se sente muito diferente dos demais em vários aspectos, como pensamento, comportamento ou sensibilidade. Não se refere a algo literal, mas ao sentimento recorrente de não pertencer aos padrões do grupo ou sociedade ao redor, de ter um jeito de ver o mundo que parece não se encaixar no comum.
Como saber se sou de outro planeta?
Esse sentimento costuma surgir quando você nota que as coisas que fazem sentido para você são vistas como “estranhas” pelos outros. Pode ser por agir diferente, sentir mais profundamente ou reagir de formas inesperadas em situações familiares. Não existe um teste definitivo, mas prestar atenção à sensação de desconexão frequente pode ser um sinal importante.
Quais sinais indicam que não sou daqui?
Alguns sinais comuns incluem: sentir-se desconfortável em ambientes sociais, dificuldade em entender normas não-ditas, perceber estímulos de maneira mais intensa (cheiros, sons, emoções), tendência à introspecção, facilidade em se perder em pensamentos ou atividades que o fascinam, e sensação recorrente de ser incompreendido pelos demais.
É comum sentir que não pertence aqui?
Sim, esse sentimento acontece com muita gente, especialmente durante a infância e adolescência, quando buscamos encaixe e aceitação. Pode ser ainda mais frequente em pessoas neurodivergentes, sensíveis ou criativas. O importante é saber que esse sentir não é sinal de fracasso ou falha, apenas uma manifestação de individualidade e percepção diferenciada da realidade.
O que fazer se me sinto diferente?
Primeiro, tente acolher esse sentimento sem culpa. Conversar com pessoas de confiança, buscar grupos de apoio ou profissionais pode ajudar a compreender melhor o que se passa. Explorar hobbies, interesses, espaços em que existe acolhimento também faz diferença. E, mais importante: nunca perca de vista que há valor em cada jeito único de ser – sua diferença pode ser, no futuro, seu melhor recurso.
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